A graça do ar de graça
Não saia pelo mundo antes de ler
estas 10 dicas muito inspiradoras…
Por Gabriela Aguerre
Ar puro, do bom, do tipo que nos faz encher os pulmões com gosto e que carrega todos os benefícios de uma respiração profunda e prazerosa, não se encontra em qualquer esquina. Nem por isso deixamos de ir e vir, visitando cidades mais ou menos poluídas, em busca de novas experiências e, digamos, alguma paz de espírito. Mas existem fatos interessantes sobre o ar, a respiração e alguns lugares do mundo que podem nortear a escolha do seu próximo destino.
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1 O ar mais limpo do mundo
Poucos pautam suas viagens pelos gases que respiram. Mas sem dúvida um ar purinho, com oxigênio abundante, é um bom efeito colateral dessa escolha. Quem vai para a Islândia, por exemplo, encontra o ar mais-lim-po-do-mun-do, segundo a Organização Mundial da Saúde. A OMS prepara relatórios bianuais sobre a concentração de poluentes na atmosfera em quase três mil estações de monitoramento no globo terrestre. Qualquer uma delas que apontar acima de 20 microgramas de poeira em suspensão por metro cúbico de ar (mg/m³) já aciona o alerta – é esse o limite considerado seguro pela OMS. Com uma concentração média anual de 8 mg/m³, a Islândia é dona de um dos ares mais saudáveis do planeta. (Só para comparar, o Brasil tem 15 mg/m³ e São Paulo, 19 mg/m³.) Na terra natal da Björk tem cachoeiras, geleiras, vulcões, gêiseres, fontes termais, aurora boreal, cenários inóspitos e intrigantes. Mesmo a capital, Reykjavik, que concentra a maioria da população islandesa (dos 320 mil habitantes, mais de um terço mora lá), é muito boa de respirar. Cerca de 85% da energia produzida no país vem de fontes hidrelétricas e geotérmicas. O combustível fóssil é pouco a pouco substituído por hidrogênio.
2 Como os bons vinhos
Outro lugar bom de respirar é o Canadá, ajudado pelo território gigantesco e a baixa densidade populacional. A cidade de Whitehorse, na província de Yukon, ao norte do país, é a recordista de ar puro. Respirar é algo que se faz sem perceber, mas assim como se saboreia um vinho nobre, por lá vale a pena tomar consciência ao inspirar e expirar, buscando aromas e notas ou observando quanto tempo o gosto fica na boca. O único risco é perder o fôlego olhando para algumas das incontáveis paisagens de lagos e montanhas ou, quem sabe, torcendo por um dos cães-lobos no campeonato anual de trenós.
3 Tudo é mais doce nos parques
Muita gente, especialmente no verão, não resiste a um gramado sombreado e logo estende a toalha do piquenique – isso é muito comum em outros países. Mas há razões que fazem os parques saudáveis, além de aprazíveis. A concentração da vegetação em uma área específica garante um ar mais puro – e também mais fresco. A temperatura nos grandes parques dos centros urbanos pode ter até 7 graus menos que as áreas ao redor. A melhor qualidade do ar e a temperatura levemente inferior faz com que todo o entorno seja beneficiado. Uma cidade com parques respira melhor. Se os Jardins de Luxemburg, o Central Park, o Tiergarten, o Stanley Park, o Buen Retiro e o Ibirapuera já fazem parte da sua lista de refúgios conhecidos para o bom respirar, experimente:
- Parc Mont-Royal, nas colinas de Montreal (Canadá). Foi projetado pelo norte-americano Frederick Law Olmsted, o mesmo paisagista que fez o Central Park de Nova York. São 200 hectares de bosques, trilhas, jardins e passarelas – e muito ar puro.
- Kew Gardens, em Londres (Reino Unido). Aberto em 1759, é um dos jardins botânicos mais importantes e antigos do mundo. A coleção de árvores é gigantesca e ocupa dois terços dos 121 hectares. Chamada de Arboretum, é composta por mais de 14 mil espécies. Passear entre elas é uma forma de estar mais perto daquelas que respiram por nós, para nós.
- Millenium Park, em Chicago (Estados Unidos). Em comparação aos dois anteriores, é um parque pequeno, de “apenas” 100 hectares (o Ibirapuera, em São Paulo, ocupa 158 hectares). Inaugurado em 2004, logo se tornou o epicentro dos endereços mais caros de Chicago. Com 500 árvores novas por ano, chega a remover quase 200 quilos de poluentes do ar a cada plantio.
4 Destino perfumado
Ar bom é como na lição da escola: insípido, inodoro e incolor. Mas não há narinas que resistam a um perfume natural. Para uma experiência sensorial desse tipo, uma boa ideia é seguir o caminho dos maiores especialistas do planeta e voar até o Pays de Grasse. Trata-se de uma região na Provence que engloba 18 vilarejos produtores de rosas, jasmins e lírios para fabricantes de perfumes famosos como Dior, Chanel e Givenchy. Outro cartão-postal é Manosque, a 35 minutos de carro de Aix-en-Provence, onde o aroma das lavandas frescas dá encanto quase sobrenatural à região. Marcas como a L’Occitane mantém fábrica por lá – aberta à visitação, inclusive. Para ver os campos floridos, a melhor época é em julho, antes da colheita. Um dos melhores lugares para ver as lavandas em flor são os campos da Abadia de Sénanque.
5 Rotas sem filtro
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), as dez cidades mais poluídas do mundo estão no Irã, na Índia, na Arábia Saudita, em Camarões e na China. Exceto por Nova Délhi, as demais não costumam aparecer na rota do turismo. Mesmo assim, vale lembrar: respirar o ar poluído afeta diretamente os pulmões e a circulação do sangue. Algumas medidas simples ajudam, como a máscara antipoluição. Esqueça as têxteis, que não filtram as partículas gasosas! Procure as que os ciclistas profissionais usam, com pedrinhas de carbono que ajudam a filtrar os poluentes. Manter-se sempre bem hidratado também ajuda, assim como não fazer grandes esforços cardiorrespiratórios e observar bem os eventuais sintomas de uma complicação respiratória.
6 Respirar onde o ar é raro
Está indo para Machu Picchu? Prepare-se para subir: a cidade perdida dos incas fica 2.430 metros acima do nível do mar. Estações de esqui, picos elevados, destinos inusitados, paisagens inóspitas: tudo isso se descortina para quem decide chegar lá em cima. Existem cuidados a ser tomados, no entanto, para uma aventura além dos 2.000 metros de altitude, onde os efeitos da hipobaropatia, ou mal da montanha – síndrome que nos Andes se conhece como soroche – começam a ser percebidos. A frequência cardíaca dispara, pois o todo o sistema respiratório se agita para captar e fazer circular o oxigênio pelo organismo. Isso pode dar início a fadiga, dores de cabeça, vertigem e náusea, entre outras complicações em casos mais agudos. Tudo pode ser evitado com uma aclimatação lenta. No caso de Machu Picchu, muitos viajantes preferem passar mais tempo em Cusco (3.400 m) antes de encarar as trilhas. Despacito, despacito, o corpo vai se acostumando e, depois, será moleza passear pelas ruas da cidade perdida.
7 Nada de baldes de chumbo nas pernas
De malas prontas para uma estação de esqui? Em média, elas estão a 3.000 metros de altitude. Valle Nevado, por exemplo, fica a 2.890 metros. O Cerro Catedral, em Bariloche, a 2.400 metros. Antes de ajustar os esquis nos pés e sentir que cada perna carrega um balde de chumbo, dê um tempo a si mesmo para se acostumar ao novo ar – que é mais puro, porém mais escasso. Os médicos afirmam que o ideal para o organismo seria subir 500 metros a cada dois ou três dias, até atingir a altitude desejada. Lembrando que as altitudes acima dos 5.400 metros são consideradas extremas: sob o ar rarefeito, apenas os muito bem adaptados conseguem sobreviver. Por isso, alpinistas que atingiram o cume do Everest (8.642 metros), do K2 (8.614 metros) ou do Annapuma (8.091 metros) são tidos como verdadeiros heróis.
8 Por favor, dois litros de oxigênio!
O ar é engarrafado há mais de 200 anos e beneficia desde pacientes de doenças pulmonares até mergulhadores. O uso recreacional do ar em garrafinhas é recente. No Japão, há pelo menos 20 anos existem bares que oferecem oxigênio no cardápio. E a coisa virou moda. Em Cozumel, o Clear Lounge, instalado em um enorme aquário, diz ser o primeiro e único bar de oxigênio subaquático do mundo – quem há de duvidar? O Breathe, em Las Vegas, ainda oferece massagens nas costas no final. Aromas são agregados às garrafinhas, para aumentar a atratividade da experiência – algo similar à de quem fuma um narguilé, mas sem o contratempo do tabaco. Como não oferece benefícios efetivos para o organismo, o oxigênio engarrafado desses bares acaba atraindo os viajantes pelo inusitado da coisa.
9 A montanha mágica do Brasil
Curativo mesmo é poder respirar livremente cercado de pinheiros, eucaliptos, tranquilidade e boa infra-estrutura. No século passado, muitos sanatórios e casas de saúde se instalavam em cidades que cumprissem essas condições, pois se acreditava que o ar da montanha curava os tuberculosos e outros doentes das vias respiratórias. Faz sentido. No Brasil, Campos do Jordão, em São Paulo, foi por muitas décadas a nossa “montanha mágica”. Por lá, nos Sanatorinhos Populares (que já não existem mais), esteve internado Nelson Rodrigues (1912-1980). Foi em uma das temporadas por lá que escreveu seu primeiro texto dramático, antes de O Vestido de Noiva. Era uma esquete cômica que fez os outros pacientes terem um acesso de riso – e de tosse, e por isso o espetáculo precisou ser interrompido.
10 Sem que ninguém veja
Para aqueles que têm saudade de ir e vir com o cigarro aceso, defendendo o livre arbítrio e assumindo os riscos que o fumo traz à saúde, não há boas notícias: desde a virada do milênio, todos os países foram aos poucos banindo a fumaça de tabaco – na propaganda, nos espaços fechados, nos prédios públicos, nos parques e por aí vai. Quem quer respirar fumaça por opção precisa se dirigir aos discretos e restritos cigar lounges. Sim, o charuto, o cachimbo e seus aficionados mantêm firme o glamour e bancam um mercado pequeno, mas vigoroso. The Wellesley Cigar Terrace, em Londres. Grand Havana Room, em Nova York. Tynska Bar & Books, em Praga. El Floridita, em Havana. São lugares chiques, geralmente exigem um dress code específico e se reservam o direito de admissão do cliente. Não são nada baratos – mas é o preço a ser pago para manter um hábito cada vez mais raro.